27 fevereiro, 2007

O que vou ouvir logo antes de morrer

:: Diogo BarbaRuiva

Já pensei nisso vezes demais: o que eu gostaria de ouvir no momento da minha morte. Como eu não acho que vá ouvir Deus falando (e nem o diabo), que seja alguma coisa boa. Sempre corre-se o risco de ser pego de calças curtas pela Danada, em um momento "É ruim, mas é bom" . Imagine só morrer ouvindo Dishwalla, Pitty ou Rádio Taxi. Seria um tanto irônico.

Se eu soubesse de fato quando iria morrer eu faria como Homer Simpson, naquele episódio em que come peixe venenoso e tem sua sentença de morte decretada pelo Dr. Hibbert. Eu ia sair fazendo aquelas coisas para as quais eu nunca tive tempo mas sempre quis fazer. Andar de patins, comprar um Ipod, ler a Ilíada.

Tendo o tempo de me preparar, eu faria de tudo para me despedir em grande estilo (musical). Teria de ser algo que dissesse tudo sobre mim e sobre minha morte, que deixasse os meus amigos e parentes emocionados, que tornasse a minha ida épica.

E os meus leitores? Não posso passar dessa para alguma outra com uma música do Queen. Ninguém me respeitaria mais. Apesar de que eu até gosto de Queen.

A faixa única e derradeira seria a sugestiva Velouria, dos Pixies. Não dá para esconder a nossa parcialidade em relação a eles aqui no blog. Eu e Rodrigo Celso somos grandes fãs dos esquisitões de Boston.

Velouria tem tudo: drama, redenção, desejo de morte, viagens místicas. É a melhor canção de guitarra que eu já ouvi. A textura das guitarras (roubando a expressão de David Bowie) faz com que o infinito da morte esteja tão perto que ela pareça iminente. Joey Santiago fraseia ao fundo, durante o verso, chamando ao eu lírico de voz frágil que Black Francis interpreta a pular naquele poço de eco e leve distorção. É a própria morte, a Velouria (velório?).

Say to me/Where have you been/Finally through the roof (Diga para mim/Onde você esteve/Finalmente atravessando o teto). Ela chega então, para buscar esse alguém que canta sobre o brilho do sempre (shine of the ever). A morte é o sempre porque ela está fora do tempo. Não penso ser uma questão de eterno ao lado de Deus e dos que já se foram; é um eterno que não há, que existe ao lado de tudo aquilo que está fora do nosso alcance. O que não é no tempo, não existe de fato. O tempo é que nos torna nós mesmos e nos faz nada novamente.

Nada mais justo do que sempre esperar a morte, adorá-la de um jeito meio estranho: Even I'll adore ya/My Velouria (Até eu irei adorá-la/Minha Velouria). O problema é que não sabemos quando o momento vai chegar. A eterna dúvida é a única certeza, alguém disse.

Velouria prestaria múltiplas homenagens no momento de minha partida: à própria morte, um conceito que é a negação da existência (muito estranho, se me perguntarem), à música, aos Pixies, que são a mais importante influência da minha formação musical, à minha memória, que é toda permeada por canções dos Pixies e ao meu irmão mais velho, que é a minha grande fonte de conhecimentos que eu demoraria a achar se estivesse sozinho nessa.

Morrer, então, seria legal.

Sugiro a todos vocês que façam esse exercício. Não é tão mórbido quanto parece. Na comunidade EU GARIMPO do orkut tem um tópico aberto àqueles que querem fazer o caminho que fiz e compartilhar com todos.