08 abril, 2007

O óbvio do sexo


:: Diogo BarbaRuiva

Dando continuidade ao tema (não proposital) “sexo no cinema”, um outro filme sobre sexo (drogas) e rock’n’roll merece menção aqui. É 9 Canções, do roqueiro Michael Winterbottom (A Festa Nunca Termina, O Caminho para Guantánamo).

As tais nove canções são algo, digamos, concreto. A história é permeada e contada por Black Rebel Motorcycle Club, The Von Bondies, Elbow, Primal Scream, The Dandy Warhols, Super Furry Animals, Franz Ferdinand e Michael Nyman; cada canção é parte do filme. Dizer trilha sonora é um engano: o filme todo pára quando a canção entra em cena. E isso é literal, porque o que aparece é uma espécie de bootleg em vídeo de cada faixa. Muito mais importante do que um simples pano do fundo.

O resto do filme também foge do convencional. O que se conta é a história de um casal de namorados. Não é um romance fácil, um caso de amor cativante embalado por ótima música. Winterbottom foi sensível ao mostrar o dia-a-dia repetitivo que existe além do furor de um amor fresco. Sim, as cenas de sexo são fortes. São gráficas, ou seja, nada é disfarçado. Para quem for um pouco menos sutil, é um filme pornô. Não é para qualquer um encarar esse sexo explícito. É um sexo humano, é isso o que mais incomoda. Assim como o resto do filme, tudo parece ter sido filmado com uma velha câmera de fita, como se fizesse parte das memórias de alguém. Difícil lidar com tanta intimidade, ainda mais quando ela nos lembra da nossa própria.

Não há música quando há sexo. Ouve-se cada ruído e estalo de beijo, cada busca de ar. A música pára tudo, ela situa o espectador. Os personagens principais resumem-se a viver seu relacionamento, a transar, comer, dormir, ouvir música, dançar e ir a shows, sem grandes momentos de reflexão guiados por diálogos complexos. É uma vida bastante parecida com a minha. Os shows na famosa Brixton Academy lembram ao espectador que ele está vendo um filme. A fantasia é duramente cutucada pela realidade, pelas bandas fazendo o papel delas mesmas.

Tudo é cru em 9 Canções. A “pornografia” não é uma tentativa de chocar, de fazer com que nos sintamos enojados. A música não quer nos tranportar para um lugar superior em nossas consciências, numa espécie de ascenção moral – uma especialidade dos filmes de Hollywood. Mesmo o roteiro não passa grandes mensagens. Michael Winterbottom soube me fazer sentir como se aquilo tudo (o relacionamento) dissesse respeito a mim também, tenha eu passado por algo semelhante ou não. Foi um raro olhar do lado de dentro da intimidade. Não vejo essa abordagem cheia de “calor humano” em nenhum outro filme dos últimos tempos.

Terminando com o que nos diz respeito propriamente, o rock, difícil dizer um filme que tenha dado semelhante importância à música. Assim como todo o resto, a música é parte da intimidade do casal. Conhecemos a maioria das bandas e das músicas, mas vemos como as perspectivas diferentes transformam coisas que julgamos conhecer. Um ponto de vista distinto torna uma velha canção em algo que desconhecemos completamente, as palavras não são as mesmas para nós e para um casal de namorados apaixonados. O óbvio do que eu disse foi muito bem colocado em 9 Canções. O evidente está exposto, não dito ou escrito, de uma maneira fantasiosa, vivido por e para nós.