20 dezembro, 2006

Livro: "Beijar o céu" [de Simon Reynolds]


Deve ter sido divertida a juventude de Simon Reynolds. Aos 21 anos ele escrevia para a Melody Maker, uma das principais revistas de música britânicas. E num tempo em que as bandas e as gravadoras dependiam da divulgação dos semanários musicais para venderem discos. Nada de vídeos ou internet. Segundo o que ele diz no prefácio de seu livro, Beijar o Céu (ed. CONRAD), havia muita liberdade nessa época. Podia-se fazer o que bem entendesse com as matérias. A crítica musical era mais do que o mero fichamento dos lançamentos e as referências não ficavam limitadas ao mercado musical; lia-se filosofia e psicanálise.

Um dos melhores momentos do livro é “O fim da infância”, retirado do livro Sex Revolts, também de Reynolds (inédito em português). A psicodelia é analisada em seu contexto estético e social para depois ser estendida até as raves dos anos 90 e 2000. Noções de psicanálise estão fortemente presentes aqui, deixando a entender que a música psicodélica e suas seguidoras (como a ambient music) tentam recriar a sensação de comunhão com a natureza e com o útero materno. Bem longe de qualquer senso comum.

A reportagem de 2001 sobre o Radiohead é um dos pontos altos do livro. Soube captar o impacto que Kid A teve no meio musical e, ao mesmo tempo, mostrar que a banda não estava preocupada com a opinião dos outros. Poucas vezes se leu alguma coisa tão boa falando de um disco. Um dos méritos de Reynolds é não pressupor que você tenha ouvido o álbum. Ele se encarrega de apresentar a música, fazendo com que nos interessemos pelo disco e pelas questões que ele levanta. A música serve para desencadear pensamentos e não só para ser ouvida.

Nem todos os textos são tão interessantes quanto os mencionados, mas todos têm o cuidado situar o assunto em seu contexto, indo além do “gosto” ou “não gosto”. Não se trata apenas de falar sobre música, mas também de pensar em como ela se relaciona com a sociedade. E, assim, entendê-la com um pouco mais de riqueza, para além da mera opinião subjetiva.

:: postado por Barba Ruiva