20 janeiro, 2007

Silêncio no palco


Em 2004, como todos sabem, os Pixies vieram ao Brasil. Depois de 12 anos separados e proclamados mortos por eles mesmos (um exemplo é a coletânea Death to the Pixies, de 1998), a grande turnê de retorno passou por Curitiba. Até hoje é difícil de acreditar que isso tenha acontecido. Se eu não tivesse presenciado tudo, provavelmente acharia que é armação.

A volta deles foi chamada de a “volta dos Beatles alternativos”. Exagerado, mas não mentiroso. Hoje ainda, mesmo sem terem gravado nenhum CD novo, eles ainda conseguem ser grandes nomes dos principais festivais do mundo. São maiores e mais influentes do que nunca.

Em decorrência de tanta euforia apareceu muita coisa para se vender: CDs das performances, DVDs, novas coletâneas. Eles querem recuperar o tempo perdido, compensar os cinco anos de uma vida de banda alternativa, sem atenção ou reconhecimento e fisgar tudo o que for possível dos nossos bolsos. O caso dos DVDs é o mais impressionante: são quatro desde 2004, sendo que dois foram lançados ao mesmo tempo no ano passado. Um com uma performance antiga (em Londres, no ano de 1988), outro da turnê de 2004, um show em um festival folk e uma apresentação em um pequeno clube de Boston. Exagero.

Há mais um, porém. Eu não diria que é um lançamento que vai na mesma linha dos citados acima, porque apesar de ser um documentário sobre a banda, não é exatamente algo que fará os fãs mais “hardcore” felizes. Em “Loud Quiet Loud” os diretores Steven Cantor e Matthew Galkin acompanharam os Pixies em mais de 60 shows, pela Europa e Estados Unidos. Mais importante, eles estavam no primeiro ensaio antes da volta.

O que parece ser, a princípio, um documento oficial da gloriosa e milionária volta da banda, na verdade, é um filme muito bem elaborado. Os diretores são fãs assumidos dos Pixies, mas não hesitaram em fazer da “Sell Out Tour” apenas o pano de fundo para o que mais lhes chamou a atenção na convivência com a banda: o relacionamento de quatro músicos cheios de problemas.

Eu disse que os fãs não iriam gostar do filme e explico o porquê: não se trata de manter o mito da banda e dos músicos. Cada um dos indivíduos é mostrado de uma maneira mais íntima, sem muita fantasia. David Lovering, por exemplo, depois do término da banda, abandonou a bateria para tornar-se mágico. Como não conseguia um sustento razoável dessa maneira usou um de seus hobbies favoritos, vasculhar terrenos com um detector de metal, para conseguir mais algum dinheiro.

Uma das passagens mais comoventes do filme - e surpreendentemente, deprovida de pieguice - é aquela em que Lovering descobre que seu pai tem um câncer incurável. Deprimido, ele passa a tomar calmantes e bebidas alcoólicas. Em um dado momento, ele se descontrola no meio de um show e não consegue perceber que continuava a tocar uma música que já havia terminado, para desespero de seus companheiros.

Todo o glamour que se imagina que uma vida de rockstar deveria proporcionar não aparece em nenhum momento do filme. O que se vê são quatro pessoas problemáticas, inseguras, lutando para serem reconhecidas e respeitadas, e que sofreram muito com o término dos Pixies. Parece-me que sofrem até hoje. O nome “Loud Quiet Loud” é uma alusão à forma de compor as músicas que os Pixies consagraram: versos mais calmos intercalados por gritaria e distorção. Na turnê, o “Loud” são os shows. O silêncio se dá depois, quando os membros do Pixies se vêem sozinhos uns com os outros.

Além da música não há muita coisa que desperte a fantasia dos fãs. Os Pixies são gente como nós, talvez um pouco mais tristes, talvez um pouco mais importantes, mas não são mitos vivos. Ser um astro do rock, nesse caso, é um ato de sobrevivência e não de nobreza.

Loud Quiet Loud
Diretores: Steven Cantor e Matthew Galkin
EUA, 2006

:: postado por Diogo BarbaRuiva - eugarimpo@hotmail.com