22 janeiro, 2007

Se imagem não é nada ... tomemos água


Ainda sobre os Pixies: no DVD lançado em 2004, show ao vivo, há um pequeno documentário que trata da influência da banda sobre os músicos de Rock de sua época. Chama-se "Gouge". O vídeo é um desfile de elogios rasgados dos membros de praticamente todas as bandas que importam dos anos 90. Descobrimos que no primeiro show dos Pixies em Londres estavam presentes, entre outros, os integrantes do Blur. Ficamos sabendo que o Thom Yorke do Radiohead é um fã de carteirinha. Daquele que tem faixas preferidas, sabe as letras de cor, discute qual é o melhor álbum etc. David Bowie (dono das análises mais argutas e precisas de todo o vídeo) resume tudo ao dizer, citando um clichê sobre o Velvet Underground, que, se os Pixies não venderam muitos discos, cada uma das cópias deve ter ido parar nas mãos de um garoto que formou uma banda influente nos anos seguintes. Como todos sabemos, um deles era Kurt Cobain.

Mas é Badly Drawn Boy quem diz o essencial: os Pixies não eram sobre imagem, mas sobre música. Quem assistir ao documentário "loud QUIET loud" (resenhado pelo Diogo no post anterior) vai entender o porquê. Todos os membros da banda são estranhos, sem charme e com muito pouco sex appeal. Na verdade, o fato é que estavam pouco ligando. Para eles, a imagem era, de fato, nada. Sua preocupação era ensaiar e ensaiar, compor suas músicas, tocar ao vivo e gravar bons discos.

É claro que essa atitude "eu não estou nem ligando" também pode ser transformada em estratégia comercial. Mas no caso dos Pixies, surgidos em plena era do marketing, não se tratava disso. E todos perceberam. Era só música. Ponto. Quase como um milagre, uma banda surgida na era da massificação e do "hype", conseguiu trazer de volta para o Rock aquilo que realmente importa.

Quem passou a adolescência ouvindo Pixies e Sonic Youth, como eu, tende a desconfiar de qualquer banda cuja estratégia comercial esteja acima do som. Pode ser eficaz, mas não dá para levar a sério. Ser a sensação do momento é muito diferente de ser criativo e tocar bem. Ao que tudo indica, uma parcela da humanidade tende a concordar comigo: a maior parte das bandas "hypadas" nos anos 90 sumiram sem deixar saudades (veja o texto do Diogo:"E os Strokes estão cada vez melhores").

Para o restante dos humanos, desejo que se divirtam com o "hype" do momento e deixem a música para nós, os feios, os gordos, os estranhos, os orelhudos; às vezes calvos, sem nenhum charme, usando óculos, ligeiramente perturbados, com dificuldades de socialização, alcoólatras, viciados em drogas... Gente que sofre de vez em quando e não vê a vida em cor de rosa. Como nossos queridos Pixies.

Não é por acaso que a fã escolhida para representar a todos nós em "loud QUIET loud" é uma simpaticíssima e linda gordinha de óculos, doente pela Kim Deal, tirada diretamente da primeira fila de um show. Na sequência final, os diretores mostram a banda dela tocando "Monkey gone to heaven" no fundo de uma garagem (nada mau aliás, exceto pelo baterista...) e, rapidamente, cortam para os Pixies ao vivo, que continuam a música exatamente na nota seguinte. É de arrepiar. Num corte, fica tudo dito. Para quem quiser e puder entender, é claro.

E a próposito, aproveito para dizer o seguinte: todos sabem que para matar a sede toma-se água e não Sprite. Se imagem não é nada e sede é tudo, tomemos água e ponto final. A quem vocês pensam que podem enganar?

:: postado por Rodrigo Celso - eugarimpo@hotmail.com