15 outubro, 2008

Como conseguir música de graça legalmente [ou Sobre como bandas independentes podem ser legais]

:: Diogo BarbaRuiva

O emule não é a única solução, caros leitores. De longe, é a mais rápida e a com o maior número de discos, de artistas famosos ou nem tanto. Por isso é também a mais fácil. E claro, existem os torrents, tão amaldiçoados pelas indústrias fonográfica, cinematográfica e televisiva.

Porém, não é preciso estar 100% na ilegalidade para conseguir mp3 e até discos (de verdade mesmo, em CD, com encarte e tudo mais) de graça. Cito dois exemplos que aconteceram comigo. E tenho dois propósitos com isso (e também com esse post): louvar a comunicação rápida entre pontos distantes e antes separados que a internet proporciona e criticar o excesso de informação que a mesma internet dispõe.

No ano passado, ouvindo o podcast de Vic Galloway na BBC escocesa, descobri uma banda de Edimburgo chamada Action Group. Claro que os achei no Myspace e fiquei amigo. Achei todas as faixas do perfil muito boas, tanto que decidi comprar o álbum de estréia, Greed, mesmo que tivesse que pagar uns 50 reais por isso. Mas não podia, porque o disco só estava disponível na loja do iTunes, que não deixa que nós, brasileiros, compremos nada. Resolvi mandar uma mensagem perguntando se era possível fazer a compra por algum outro site, algum que fizesse entregas internacionais.

Os eventos que se seguem me fizeram virar fã da banda, para além da música propriamente dita. Eles agradeceram o interesse, perguntaram como eu tinha conhecido eles, etc. Algumas linhas abaixo, perguntaram meu endereço e mandaram abraços. Eu, meio confuso, respondi questionando como eu iria pagar pelo disco, se era possível fazer algum tipo de transferência via Pay-Pal ou algo do gênero. Foi surpreendente ler que eles tinham ficado animados com o fato de um brasileiro - alguém que mora tão longe de Edimburgo - havia curtido o som e resolveram me me mandar o disco pelo correio, de graça. Fiquei achando estranho, mas mandei meu endereço mesmo assim. Dois meses depois, chega um pacote com o carimbo da Royal Mail Company. Não tive dúvida do que era e encontrei Greed, verde e sem nenhuma rachadura na caixinha. Além disso, uma carta escrita a mão (com uma letra muito ruim) agradecendo (que ironia; eles é que pagaram o frete!) e desejando o melhor para mim (all the best).

Outro exemplo, menos "épico", mas tão legal quanto, é do Ablespacer, também do Reino Unido. Arrisquei a mesma estratégia de perguntar se eles vendem o EP Butterfly Catch de outra maneira que não pelo iTunes (sim, de novo). Mais uma vez, uma boa surpresa. Um dos componentes da banda me mandou os dois EPs por email. Ele até teve que levar os arquivos de sua casa num pen-drive para que pudesse mandá-los do trabalho.

A internet é realmente uma ótima ferramenta. Garante comunicação instantânea e troca de informações que antes só podiam circular fisicamente (num CD ou disco). Porém...

Voltando ao emule: você consegue baixar quantos discos quiser ao mesmo tempo ou em etapas. Tem quase tudo disponível em poucos passos. Será que isso é necessariamente bom? Tomo uma posição e digo que não. Na internet, existe informação demais. É difícil exaurir um conteúdo, mesmo que se insista muito. O problema, porém, não está somente no excesso de informação, mas na relação que estabelecemos com ela. Nesse caso, eu. Precisamos pensar se tudo o está disponível está sendo de fato absorvido por nós, se essa informação toda não está sendo instrumentalizada, se não estamos consumindo informação só por consumir, sem dar algum sentido ao que aparece na nossa frente. Creio que as coisas não devem ser apenas úteis e divertidas, mas também causarem algum tipo de reflexão, e não precisa ser necessariamente algo extremamente intelectual. Sinto saudade da época em que era fácil se lembrar de épocas da vida pelas músicas que tocavam no rádio.

Hoje está tudo ali, de Abba a Shostakovich, de Dominguinhos a Arctic Monkeys. Vejam só, não estou condenando nada e ninguém, isso é só a expressão de uma opinião e um desabafo. Talvez exista mais gente por aí procurando se relacionar com as novas tecnologias de uma maneira um pouco mais lenta, mas afetiva até. É por isso que eu vou me dedicar à audição cuidadosa dos discos de Ablespacer e Actiongroup. Para ter de novo aquele gosto de conquista, de felicidade por poder ouvir algo que não é fácil de conseguir. Mas claro, vou organizar a fila de 10 cds que estou baixando pra ouvir alguma hora dessas.